3 de Janeiro de 2023, às 12:00
Há mais de 30 anos, Faraó, de Margareth Menezes, estabelecia um novo significado para o samba reggae no Brasil e mudava para sempre a história do nosso Carnaval.
Eternizado na voz de uma das cantoras baianas mais famosas de todos os tempos, esse grande sucesso tomou conta das ruas de Salvador em 1987, quando foi lançado.
Depois que já estava na cabeça e na boca dos amantes do Carnaval, a música ganhou as rádios de todo o país. Mas o que muita gente não sabe é que a sua letra carrega um significado muito importante para a cultura negra e a exaltação dos elementos que a compõem.
Pensando nisso, chegou a hora de conhecer a história e o significado por trás de Faraó, de Margareth Menezes, e compreender a razão de tanta repercussão. Vamos lá?
Faraó – Divindade do Egito é o primeiro samba reggae gravado no Brasil e marcou o início desse gênero que é a cara do nosso Carnaval, principalmente na Bahia.
Ela já foi gravada pelo Olodum, pela Banda Mel e pela Margareth Menezes. Foi essa última interpretação, inclusive, que contribuiu para que ela fizesse sucesso em todo o país e se consagrasse como um marco do axé antigo.
A composição é de Luciano Gomes, que já fazia parte da ala de canto do Olodum. O artista foi convidado para criar uma canção para o Festival de Música e Artes do Olodum (FEMADUM). O tema escolhido pelo grupo foi o líder do Império Egipcio.
Depois de estudar a fundo a cultura egípcia, o compositor acabou criando, sem saber, aquela que seria considerada uma das melhores músicas do Olodum. Confira a seguir o significado de Faraó.
No Egito Antigo, os faraós eram cultuados pois, de acordo com a cultura indígena, eles eram considerados deuses, dotados de poderes sobrenaturais e responsáveis pelos fenômenos da natureza.
Logo na primeira estrofe, somos apresentados ao início dessa narrativa mitológica. De acordo com os mitos egípcios, no começo do Universo, reinava o caos, personificado pelo deus Nun, que significa a origem de tudo.
Nun se torna Atun, o deus que cria todos os outros deuses. Um deles é Shu, deus do ar, mencionado nestes versos iniciais da canção:
Deuses
Divindade infinita do universo
Predominante
Esquema mitológico
A ênfase do espírito original
Shu
Formará
No Éden um ovo cósmico
O segundo faraó que aparece na letra da canção é Osíris, associado à vida e à vegetação. De acordo com essa cultura, as suas lágrimas correspondem às cheias do rio Nilo – por isso ele também é associado à ideia de fertilidade.
Com a ajuda de Anúbis, o deus do Mundo dos Mortos, Osíris emerge do Nilo. Assim, ele se torna o seu sucessor. Essa passagem é narrada no seguinte trecho de Faraó, de forma bem resumida e abstrata:
A emersão
Nem Osíris sabe como aconteceu
Nas estrofes seguintes da música, uma passagem anterior da mitologia é mencionada, para explicar como nasceu Osíris. Aparecem Geb, o deus da terra, e Nut, a deusa do céu, filhos de Shu e Tefnut, a deusa da chuva.
Embora fossem irmãos, Nut e Geb se relacionaram e, dessa união, nasceram quatro filhos: Osíris, Ísis, Seth e Néftis.
Epopéia
Do código de Geb
E Nut
Gerou as estrelas
Apesar de serem irmãos, Osíris e Ísis se apaixonam e acabam se casando. Indignado, Seth mata Osíris.
Osiris
Proclamou matrimônio com Ísis
E o mal Seth
Irado o assassinou
Lembra que Osíris morreu e se tornou o novo deus do Mundo dos Mortos? Só que, antes de ir embora, ele concebeu um filho, Hórus. E o seu destino é narrado em mais um trecho de Faraó:
Horus levando avante
A vingança do pai
Derrotando o império do mal Seth
Ao grito da vitória
Que nos satisfaz
Uma curiosidade super interessante sobre a batalha contra Seth é que, durante o conflito, o filho de Osíris teve um olho arrancado. Mais tarde, ele foi substituído por um amuleto, que foi eternizado pela cultura do Egito Antigo como o Olho de Hórus. Ele representa poder e proteção para aqueles que o carregam consigo.
Além das referências egípcias, Faraó também fala sobre a relação dessas referências com alguns elementos das culturas baiana e africana. Afinal, o Egito também faz parte da África.
Pelourinho
Uma pequena comunidade
Que porém Olodum uniu
Em laço de confraternidade
Despertai-vos para
Cultura egípcia no Brasil
Em vez de cabelos trançados
Veremos turbantes de Tutancâmon
Com o histórico de dominação das políticas do Imperialismo no século XIX na África, muitas comunidades africanas foram dizimadas ou perderam a sua identidade para as nações dominantes.
Além disso, muitos grupos foram agregados a outros e foram forçados a abandonar as suas individualidades. Por isso, Faraó também é um convite para que o povo negro, inspirado pelas divindades egípcias, lute por sua liberdade e pela valorização de sua cultura.
E as cabeças
Enchei-se de liberdade
O povo negro pede igualdade
Deixando de lado as separações
Além de todas as referências históricas e culturais presentes na canção, não podemos deixar de falar também sobre o seu refrão marcante. Afinal, essa é a parte da letra que todo mundo lembra e canta, em alto e bom som, atrás do trio.
De acordo com Luciano Gomes, ele tinha o hábito de iniciar as suas criações musicais exatamente pelo refrão. Segundo ele, a letra pode até ser forte e emblemática, mas, se não tiver um refrão marcante, ela não fará sucesso.
É por isso que ele pensou em versos que fossem fáceis de lembrar, mas que continuassem a fazer referência ao tema do Egito Antigo. Olha só o resultado que, provavelmente, você já conhece muito bem:
Eu falei faraó
Êee faraó
Eu clamo Olodum Pelourinho
Êee faraó
É pirâmide da paz e do Egito
(…)
É que mara mara
Maravilha ê
Egito Egito ê
Gostou de saber mais sobre o significado de Faraó, sucesso na voz de Margareth Menezes? Então, não deixe de contar pra gente nos comentários se você imaginava que esse hit de Carnavais passados tinha tanto pra te ensinar!
Além de Margareth Menezes, principal intérprete de Faraó, que você acaba de descobrir o significado, vários outros artistas que também nasceram na Bahia têm destaque na música brasileira.
Pensando nisso, não deixe de conferir a nossa seleção com grandes cantores baianos.
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