Carta de Longe
Fernando Tordo
Eu hoje morri tão longe
Mas ontem estava tão perto:
Um homem quando não foge
Parece quase um deserto,
Que estando longe está perto
Daquilo que vem mais cedo.
A morte não temo, não tremo de medo
Que venha o silêncio, que venha o degredo
Não serei cativo, não direi segredo
Vivo! eu vivo da seiva eu vivo da força
Que trago escondida ou ternura ou corça
De tão perseguida condenada à forca
Morrida! morrida mas nunca morta
Triste mas não vencida.
A morte não bate à porta
De quem morreu pela vida.
Eu trago no peito a rosa vermelha
Da nossa carícia da minha centelha
A pétala de ontem a música de hoje
Perfeita! perfeita mas sempre igual
Rosa de um tédio total
Invento a ternura renego a desgraça
Eu sou o instante que o tempo ultrapassa
Eu sou o mirante do largo da graça
Mas desde a infância tão longe da raça
Que já me esqueci dos gritos da praça
E vejo a saudade por uma vidraça
Que põe a cidade vestida de caça (bis)
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