Calvário
Vicente Celestino
Sobre uma cama carcomida
Parecida com a tristeza
Da mais triste das prisões
Ele rolava o dia inteiro prisioneiro
De um mal terrível
Que roia os seus pulmões
Tão moço ainda não vivia nem morria
No meio termo de cortar o coração
E quando a tosse o visitava, desfolhava
Rodas de sangue ainda quente pelo chão
Ele sofria sereno naquele quarto sem luz
A recordar o nazareno
Vergada ao vento da cruz
Nunca maldisse da sorte
Pensava sempre no bem
Até na hora da morte
Não se queixou de ninguém
Era seu intimo desejo
Dar um beijo na velhinha
Que lhe dera o próprio ser
Mas tinha medo de beijá-la e condená-la
A sofrer tanto quanto ele até morrer
Nesse dilema incessante torturante
Um belo dia o seu calvário terminou
E analisando aquela cena tive pena
Muito mais pena da velhinha que ficou
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