O Que Será (À Flor da Terra)

Ambiguidade e resistência em "O Que Será (À Flor da Terra)"

"O Que Será (À Flor da Terra)", de Chico Buarque, se destaca pela ambiguidade central de sua letra, que nunca revela explicitamente o que é esse "o que será". Essa escolha abre espaço para múltiplas interpretações, que vão desde a pulsão sexual até o desejo de liberdade em tempos de repressão política. O contexto da ditadura militar no Brasil reforça a leitura política, especialmente em versos como “O que não tem censura nem nunca terá” e “O que não tem governo nem nunca terá”, sugerindo algo indomável, impossível de ser controlado ou silenciado, como a vontade de expressão e a resistência coletiva.

A música também pode ser vista como uma reflexão sobre forças universais e instintivas, presentes em todos os âmbitos da vida. Versos como “Que vive nas ideias desses amantes / Que cantam os poetas mais delirantes / Que juram os profetas embriagados” mostram que esse mistério atravessa diferentes grupos sociais e situações, do amor à marginalidade, do sagrado ao profano. A repetição da pergunta “O que será?” e a enumeração de lugares e pessoas onde esse sentimento se manifesta criam uma sensação de busca coletiva por algo essencial, que está “na natureza” e desafia qualquer tentativa de definição ou contenção.

A recusa de Chico Buarque em explicar o significado da letra, somada à reação dos censores da época, reforça o caráter enigmático e universal da canção. "O Que Será (À Flor da Terra)" se torna, assim, um hino ao que é impossível de ser nomeado, mas que move multidões, seja desejo, esperança, liberdade ou amor – algo que, como diz a letra, “não tem juízo” e “não tem vergonha”.